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O jornalismo de saúde entre o narrativo e o digital: reflexões de uma jurada do Prêmio Roche
“As pessoas não querem mais ler”. Como jornalistas, certamente já escutamos essa frase, sobretudo quando trabalhamos em um meio de comunicação. E em um mundo inundado por TikToks, reels, shorts e histórias, não é estranho que muitos pensem assim.
Mas para Sabrina Duque, jornalista, tradutora e uma das juradas do Prêmio Roche de Jornalismo em Saúde 2021, “é um mito o leitor que não lê. O que temos são leitores com necessidades diferentes de acordo com a situação”. E são essas necessidades, assegura a equatoriana, que vão indicando como a informação deve ser divulgada atualmente.
A necessidade de levar em conta novos formatos e suportes ao fazer a reportagem é indiscutível; mostra disso é o fato de que os meios de comunicação tradicionais têm perfis nas redes sociais para maior difusão de suas notícias. Há, inclusive, meios que surgem e vivem unicamente nessas plataformas.
Duque não tira a importância da parte gráfica e de ajudas visuais em um trabalho jornalístico, mas afirma que o básico é o texto, porque pode atrair, segurar e envolver o leitor. “Não podemos nunca menosprezar o valor da narrativa. Que o repórter saiba contar bem a história, que faça o leitor sentir que está no local dos fatos e compreender o que está sendo contado é algo maravilhoso e que só pode ser conseguido com uma boa narrativa”, diz.
Segundo a jornalista, para encaixar uma boa narrativa, deve-se ir além do “do mero registro de algo, de dar uma visão medíocre do que está acontecendo. É preciso encontrar a forma de contar uma grande história, bem escrita, e que o público a leia e fique preso nela assim como você fica preso a um bom conto.”
Para a jurada na categoria Jornalismo Escrito do Prêmio Roche 2021, outras lições também são importantes para não deixar para trás a qualidade narrativa. Ela observou algumas dessas lições durante a avaliação dos trabalhos inscritos na edição deste ano da premiação.
“A grande força motora do jornalismo é o trabalho em equipe; inclusive em textos nos quais há só um ou dois autores, existe um trabalho de muitas outras pessoas atrás deles: o editor, por exemplo; um checador de dados, entre outros. Algo que também deve sempre estar presente é a originalidade. Deve-se buscar textos que fujam do que já está muito visto e dar um passo além na cobertura”, assegura.
O exemplo
Apesar da importância de se manter, para Sabrina Duque, o valor do jornalismo escrito, dos textos longos e das histórias detalhadas, que grudam nas pessoas e se tornam uma companhia para o leitor, ela compreende a necessidade de aterrizar o presente no digital, imediato e diverso, o ambiente em que vivemos atualmente.
Sabrina usa o The New York Times como um exemplo de um meio tradicional que não ficou no passado e segue mostrando o caminho com novas tecnologias e maneiras de informar. Não há um meio mais tradicional e que esteja, ao mesmo tempo segundo a jornalista, na vanguarda dos formatos digitais, alcançando um grande número de assinantes. “É um grande mastodonte que não fica no passado, segue indo pra frente e abrindo caminho”, diz.
No caso da América Latina, Sabrina Duque cita La barra espaciadora, Plan V e Salud con Lupa como meios de comunicação que compreenderam que para fazer o jornalismo que queriam deveriam deixar o tradicional para atrás e assimilar como a internet mudou o panorama.
“O conteúdo não pode ser o mesmo para todas as plataformas usadas para informar agora (…) Dinheiro e recursos – e a falta desses – não são um impedimento para fazer o que as novas plataformas e formas de informar estão pedindo. É uma questão de vontade”, enfatiza a jornalista.
E o Jornalismo de saúde?
Segundo Sabrina Duque, a cobertura jornalística das pautas de saúde é um cenário no qual a descrição do escrito pode se aliar a uma grande diversidade de formatos e plataformas de difusão a favor do público, pela utilidade e capacidade de ensinar algo novo e para se estar próximo das pessoas através do que se informa.
Sua experiência como jurada do Prêmio Roche em 2021 lhe permitiu conhecer novos jornalistas e meios de comunicação nativos digitais, que – assegura – usam e divulgam dados, cifras e informação em geral com destreza, sobretudo com o bom uso dos formatos digitais e visuais, com qualidade narrativa e sem cair no clickbait para ganhar influência.
“Há uma inquietação nos repórteres que sentem que (o jornalismo de saúde) é seu caminho. Ninguém está fazendo isso, então eles assumem a tarefa”, opina a equatoriana, também lembrando que o nível de originalidade e qualidade da cobertura de saúde atualmente na região vem deles. “O jornalismo de saúde não é só cobrir uma pandemia, é ver as estruturas, ver as vulnerabilidades, ajudar as pessoas com tudo o que tenha a ver com bem-estar e ciência”, conclui.
Sobre o Prêmio Roche
O Prêmio Roche de Jornalismo em Saúde é uma iniciativa da Roche América Latina com a Secretaria Técnica da Fundação Gabo, que busca premiar a excelência e estimular a cobertura jornalística de qualidade sobre temas de saúde e ciência na América Latina, integrando os olhares sanitário, econômico, político, social, entre outras áreas de investigação no jornalismo.