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Ganhadores

Relatoria do Prêmio Roche de Jornalismo em Saúde – Categoria Jornalismo Escrito 2017

Relatoria do Prêmio Roche de Jornalismo em Saúde – Categoria Jornalismo Escrito 2017

agosto 08, 2017

Relator: Orlando Oliveros

Fotografia: Rafael Bossio

Jurados:

Debbie Ponchner

Jornalista científica bilíngue com mais de 15 anos de experiência em meios impressos, digitais e na direção de salas de redação. Iniciou sua carreira como jornalista científica no seu país natal, Costa Rica, trabalhando para o jornal  La Nación. Em 2005, propôs e criou a primeira seção diária de ciência desse jornal, desempenhando-se como editora. Após algum tempo passou a ser chefe de redação do La Nación. Em setembro de 2014 se mudou para Nova Iorque para criar e liderar o website em espanhol da revista Scientific American. Seu trabalho a transformou em uma merecedora de vários prêmios jornalísticos, entre eles o Prêmio Nacional de Jornalismo Jorge Vargas Gené (2002 e 2005) e o Prêmio Nacional de Jornalismo  Científico entregue pelo Conicit (2002, 2005 e 2008).

Cristiane Segatto

Colunista online de Saúde e repórter especial da Revista Época (São Paulo), trabalhou  no jornal O Estado de São Paulo e na Editora Abril. Já recebeu aproximadamente 20 prêmios nacionais e internacionais durante sua carreira. Entre eles, dois prêmios Esso de Jornalismo na categoria Informação Científica, Tecnológica ou Ambiental (em 2012 e em 2014). No ano de 2015, foi finalista do Prêmio Gabriel García Márquez de Jornalismo, na categoria texto com a reportagem  “O lado oculto das contas de hospital”.

Assessora médica:

Fernanda Hernández

Médica cirurgiã da Universidade Militar Nueva Granada, especialista em Epidemiologia e possui um mestrado em Administração em Saúde da Universidade del Rosario. Atualmente cursa um mestrado em Medicina Antienvelhecimento e Longevidade com a Universidade de Barcelona. Sua prática médica está misturada a uma trajetória longa e excepcional em meios  de comunicação. Desempenha-se como editora e apresentadora da seção de Saúde de Notícias Caracol desde 11 anos. Atualmente, participa também no programa de rádio  “Mañanas BLU”.

Introdução

Pelo quinto ano consecutivo, Laboratórios Roche da América Latina em parceria com a Secretaria Técnica da FNPI- Fundação Gabriel García Márquez para o Novo Jornalismo  Ibero-Americano convocou e reconheceu a excelência do Jornalismo latino-americano nos temas relacionados com a saúde.

Nesta edição, 24 trabalhos na categoria Jornalismo Escrito e 19 peças audiovisuais na  categoria Televisão e Vídeo foram selecionadas entre as 489 inscrições provenientes de 18 países da América Latina para serem julgados na etapa final, por uma dupla de jurados escolhidos  pela  Fundação devido a sua ampla experiência.

A etapa final de julgamento, foi realizada na cidade de Cartagena de Índias (Colômbia), no  hotel Movich, e consistiu de duas jornadas repartidas  entre os dias 3 e 4 de junho. Durante a segunda jornada, Debbie Ponchner, Cristiane Segatto e a doutora Fernanda Hernández avaliaram critérios sob os quais escolheram ao vencedor e aos dois finalistas da categoria Jornalismo Escrito.

José Luis Novoa, diretor do Centro de Jornalismo da FNPI, deu as boas-vindas aos jurados e a assessora médica e reconheceu a autonomia deste trio para julgar cada um dos textos jornalísticos da etapa. Também grifou a importância do Prêmio Roche de Jornalismo em Saúde frente ao âmbito jornalístico atual, pois se trata de um Prêmio que entra em sintonia com a crescente necessidade de vincular a ciência com a cobertura jornalística na  América Latina.

Analisando os trabalhos inscritos, Novoa destacou o fato de que a maioria dos textos que chegaram até a etapa final foram escritos de forma grupal, a diferença das versões  anteriores do Prêmio onde prevaleciam os trabalhos individuais. Da mesma forma,  afirmou que a partir da leitura das diversas histórias e investigações participantes no  Prêmio, é possível construir uma valiosa radiografia da saúde na América Latina.

Para finalizar, agradeceu a presença dos jurados e refletiu ao redor da ética e a responsabilidade da cobertura jornalística em geral, cujos valores se refletem no ofício de repórter de Gabriel García Márquez e no espírito da Fundação, desde onde se pretende relacionar a experiência do jornalismo com a mesma experiência do ser humano.

Cobertura da saúde: da crítica ao rigor científico

Após se concentrarem nos 24 trabalhos que chegaram até a etapa final, Ponchner, Segatto e Hernández se enfocaram naqueles textos que plantearam com efetividade uma crítica política, econômica ou social em torno a temas de saúde e que a sustentaram com uma sólida evidência científica.

Para o Júri, a boa cobertura jornalística da saúde é uma fusão harmônica entre uma investigação que revele realidades com qualidade narrativa e rigor científico. Isto  implica assumir ao jornalismo de saúde como sendo um fenômeno que vai mais além dos simples conselhos médicos e, por conseguinte, como um ofício capaz de passar uma visão crítica sobre diferentes acontecimentos relacionados com a saúde e que ao mesmo tempo se desbordam em contextos jurídicos, políticos, econômicos, culturais, éticos e humanos.

“Devemos convidar aos jornalistas que trabalham com saúde e a aqueles que estão se formando na profissão para que enfrentem se questionem e questionem inclusive às grandes autoridades, a compreender, a serem capazes de desprender-se dos prejuízos, a se transformarem em bons observadores e, o que considero essencial, a empatizar”, comentou ao respeito Fernanda Hernández.

Como um representante exemplar do exercício crítico e o rigor científico, o Júri qualificou a reportagem do jornalista Vinicius Sassine titulado Recusas da FAB impedem transplantes de 153 órgãos publicado no jornal O Globo, do Brasil. “é um excelente trabalho de investigação e de denúncia que evidencia um vazio legal que acarreta na perda de centenas de órgãos para transplantes por falta de transporte”. Afirmou o Júri, argumentando por sua vez que o texto de Sassine “fez um seguimento que permitiu que se tomassem decisões políticas que efetivamente salvaram vidas, reivindicando o trabalho da denúncia jornalística”.

Por estas razões, o Júri deu o título de vencedor na categoria de Jornalismo Escrito a este trabalho. Além do mais, destacaram a forma com a qual o jornalista dá um bom uso a Lei de acesso a Informação e alcança “um argumento contundente confrontando as histórias dos pacientes à espera de um órgão para o transplante –que não chega– com as dos políticos que sim receberam o traslado aéreo da Força  Aérea”.

Em contraste com as virtudes do trabalho vencedor, o Júri encontrou outros textos que possuíam histórias interessantes e críticas, mas que infelizmente não estavam baseados  em um fundamento científico consistente. De acordo com Ponchner, Segatto e Hernández, o problema da ausência de evidência e de rigor científico leva ao desenvolvimento de prejuízos ou generalizações diante das ferramentas e dos tratamentos médicos, provocando, por consequência, que os leitores interiorizem pontos de vista errôneos sobre determinados aspectos da medicina.

Nesse sentido, os textos destacados pelo Júri, foram aqueles nos quais a investigação manteve certa objetividade e foram abordadas problemáticas da realidade sem  tendências políticas e prejuízos injustificados contra alguns medicamentos ou procedimentos médicos.

A importância da qualidade narrativa

Diante da sua defesa de uma cobertura jornalística de saúde que maneje a crítica e o rigor científico, o Júri adicionou um elemento na qualidade narrativa. Para Ponchner, Segatto e Hernández é essencial que uma reportagem possua um rosto humano e criativo onde o científico não discuta com a fluidez da história. Para isso, é importante que a narração envolva ao leitor e que o saiba conduzir através dos conceitos médicos sem chegar a confundi-lo. A qualidade narrativa é, de acordo com o Júri, o que faz com que um trabalho seja uma história e não um texto de divulgação científica.

Da mesma forma, quando uma narração adquire mais valor e profundidade é quando o jornalista é capaz de realizar um segmento contínuo de sua problemática, ou seja, um repórter diário.

“Apesar do esforço por registrar a visão de múltiplas fontes em diferentes textos e vídeos,  falta mais investimentos na  construção das narrativas dos trabalhos. Alguns textos resultaram ser muito burocráticos, sem a capacidade de envolver ao leitor com as emoções  que o tema poderia causar. Com treinamento, esforço e muita reescrita, a qualidade da narrativa pode ser melhorada”, argumentou Cristiane Segatto.

Temas recorrentes: gravidez na adolescência, mortalidade materna e Zika

Fazendo uma revisão nos trabalhos que chegaram até a etapa final, o Júri destacou que jornalistas de diversos países da América Latina mantiveram a mesma temática em comum, é o caso do tema sobre a gravidez na adolescência e a mortalidade materna, um problema que foi abordado desde o México por Guadalupe Camacho em: Matrimonio infantil, tradición que mata (QUO México), desde a Bolívia por Zulema Alanes em: Mortalidad Materna en Bolivia, más allá de las cifras (Agência de Notícias Fides) e desde a Nicarágua por Luis Eduardo Martínez em: Dos veces madre antes de los 14 (La Prensa).

Para o Júri, esta recorrência do tema resultou ser muito significativa, já que traz uma espécie de cartografia que conta os problemas similares no campo da saúde que sofrem  distintos países na América Latina. O anterior nos mostra que as políticas de saúde pública podem chegar a ser um assunto que pode ser mais continental do que nacional.

“A gravidez na adolescência e a mortalidade materna, temas de grande relevância na América Latina, foram retratados em países da região. As reportagens possuem o mérito de mostrar com clareza os determinantes sociais que interferem nas condições de saúde   –tais como estruturas de exclusão, desigualdade e iniquidade-”, afirmou Cristiane Segatto.

Paralelo a estes temas, o Júri também percebeu a frequência de trabalhos enfocados no  vírus Zika, em especial os que vieram do Brasil. Entre estes, exaltou a Zika vírus –Uma ameaça mundial, de Silvia Bessa Cunha e Alice de Souza (Diário de Pernambuco) e De onde vem essa zika?, de Verônica Almeida e Camila Almeida (Revista Superinteressante), que foram escolhidos como finalistas, e a Microcefalia e zika cada vez mais juntas de Cinthya Leite (Jornal do Commercio), que foi reconhecido com uma menção de honrosa.

Sobre Zika vírus –Uma ameaça mundial os jurados concluíram: “Este trabalho foi escolhido como finalista devido a que mostra, com um manejo adequado da linguagem e dos recursos visuais e narrativos, o impacto da epidemia de Zika no nordeste do Brasil. Além disso, exibe as carências do sistema de saúde e a forma com as quais as diferenças  socioeconômicas atuam um papel determinante na epidemia. Também é um exemplo do bom jornalismo regional onde as jornalistas, devido ao fato de estarem mergulhadas na comunidade, são capazes  de comunicar uma história mais fiel a realidade”.

Por sua vez, sobre De onde vem essa zika? afirmou: “Com uma prosa maravilhosa as autoras conseguem traduzir conceitos  científicos complexos. É um texto claro e acessível  que explica o que se sabe sobre a origem e as consequências da Zika. O Júri destacou a  capacidade das autoras para produzir uma narração agradável e fluída para o leitor”.

A menção honrosa para Microcefalia e zika, cada vez mais juntas se justificou pela  capacidade que esse trabalho tem em mostrar “a importância da cobertura diária, diligente e exaustiva de uma epidemia com um grande vazio de conhecimentos. O  conjunto de reportagens contribuiu para construir um registro mais completo da situação  e das suas consequências”.

O impacto ambiental rumo a um novo eixo temático?

Logo após sua decisão final, o Júri e a assessora médica debateram em torno aos trabalhos imersos dentro de um tema relacionado com o impacto ambiental e seus efeitos na saúde das pessoas. O exemplo mais notável foi a reportagem La mancha dorada, de Andersson Boscán Pico publicado pelo Diario Expreso do Equador, onde se “revelam as grandes dimensões da contaminação dos rios do país por mercúrio, um problema provocado pela  mineração irresponsável e pela falta de controle adequado da atividade pelo Estado”.

Este tipo de tema, além de apontar para um jornalismo mais global, gerou a dúvida sobre se poderia ser incluído dentro de alguns dos seis eixos temáticos principais do Prêmio –inovação nos cuidados da saúde, biotecnologia em saúde, acesso a tratamentos de saúde, investigação e desenvolvimento em temas de saúde, regulação e políticas públicas de saúde, oncologia-.

Ao final, o Júri e a assessora médica propuseram considerar, para futuras versões do Prêmio, um novo eixo temático que envolva os problemas ambientais e suas consequências médicas na população que as sofre.

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