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Ganhadores

Relatório do Prêmio Roche de Jornalismo em Saúde 2014

agosto 08, 2014

Relatora: Saia Vergara Jaime

Introdução

O Prêmio Roche de Jornalismo em Saúde, é uma iniciativa da Roche em parceria com a Secretaria Técnica da Fundação Gabriel García Márquez para o novo Jornalismo Ibero-americano-FNPI-. Seu objetivo é “reconhecer a excelência e estimular a cobertura jornalística de qualidade sobre temas de saúde na América Latina”.

O concurso conta com duas categorias a cada ano: em 2014, buscamos trabalhos feitos para Rádio e Internet; já em 2015 para Jornalismo escrito, televisão e vídeo. Além disso, as bases são focadas em seis temáticas:

Inovação nos cuidados da Saúde
Biotecnologia em Saúde
Acessos aos tratamentos de Saúde
Pesquisa e desenvolvimento nos temas de Saúde
Regulação e políticas públicas de Saúde
Oncologia

No primeiro concurso, realizado em 2013 foram recebidos 177 trabalhos provenientes de 17 países da América Latina, já o segundo concurso, realizado em 2014 recebeu 208 trabalhos provenientes de 19 países do continente.

O Júri e os jurados da pré-seleção do Prêmio Roche de Jornalismo em Saúde foram escolhidos com total independência pela FNPI “siglas em Espanhol”, cumprindo com a sua função de Secretaria Técnica do Prêmio.

Na categoria Rádio de 2014, os jurados foram: Felipe Valenzuela, diretor executivo das Emissoras Unidas da Guatemala, e Cecilia Vaisman, docente de jornalismo da Universidade Northwestern e co-fundadora da Homelands Productions.

Na categoria de Internet do Prêmio Roche de Jornalismo em Saúde, os jurados foram Liliana Sanchez-Andres, vice-presidente de programação de Hola Doctor e editora da Univisión Saúde, e Patricia Fernández de Lis, Diretora da Esmateria.com.

Em ambas as categorias, o Dr. Juan Rivera, médico internista e cardiologista, especialista em doenças cardiovasculares e Diretor de Cardiologia Preventiva do Hospital Mount Sinai atuou como conselheiro e assessor médico.

Ricardo Corredor, Diretor Executivo da FNPI explica que a aliança com a Roche para a criação de um Prêmio com estas características é fundamental para o jornalismo em saúde, pois trata-se de um assunto que está muito disperso nos meios de comunicação, assim como possui muito pouco espaço. Apesar de ter uma ampla cobertura, diz ele, está repleto de desafios. Este tipo de concurso, além de permitir realizar um mapeamento das dinâmicas do jornalismo em saúde, identifica temas, tendências, regularidades e inovações. Cada deliberação, além de escolher ao vencedor e aos dois finalistas, gera reflexões em torno às convocações e às mudanças que vão sofrendo as formas de narração jornalística.

Em parceria com a Roche, foi decidido a inclusão de um especialista, neste caso o doutor Juan Rivera, que vai garantir a relevância, a pertinência e a precisão dos conteúdos médicos. Além da ênfase acadêmica do doutor Rivera, sua familiaridade e experiência com os meios de comunicação contribuíram no debate com os jurados.

TENDÊNCIAS, TEMAS E NARRATIVAS: ABRINDO AS PORTAS PARA A INOVAÇÃO

Para Cecilia Vaisman, os trabalhos inscritos na categoria rádio, possuem uma tendência geral de informar a maneira como está atuando o serviço público, sobre a natureza de certas doenças e tratamentos, ao invés de aprofundar no que se refere ao essencialmente jornalístico. Poucos procuram abordar novos problemas, novos tratamentos e novas problemáticas ou gerar debates ou controvérsias, contrastando versões ou integrando relatos de fontes não oficiais, de pessoas que sofrem com as doenças. O jornalismo em Saúde deveria involucrar “as pessoas que conhecem intimamente a realidade das doenças e investigar suas experiências. Isso agregaria um imenso valor jornalístico aos trabalhos”.

Felipe Valenzuela, por sua vez, acha que existem mais programas políticos do que programas de saúde. Entende-se que as duas questões estão ligadas e que ele “nos mostra o leque de possibilidades que há nos afazeres diários.” No entanto, devemos aderir de forma mais rigorosa com as bases do concurso que visa, entre outras coisas, que, através dos trabalhos sejam mostradas “doenças emergentes, novos dados, problemas precocemente detectados, em vez de uma ladainha de dados que tantas pessoas já sabem” acrescenta o Dr. Juan Rivera. Em sua opinião, muitos dos programas se concentraram na parte social e legal da saúde, descuidando a parte clínica e tecnológica, que também são de interesse vital para os cidadãos.

Felipe Valenzuela lembra que existem questões que “sofrem um abandono total”, como os problemas de saúde mental ou saúde preventiva, enquanto os recorrentes são o HIV, diabetes, e especialmente o câncer. Nestes casos é difícil encontrar algo novo, atraente, que forneçam informações e soluções.

Em termos de abordagem, Cecilia Vaisman acha que é mais interessante privilegiar um aspecto da investigação, aprofundar, falar com a fonte e não apenas com os especialistas. Qualquer trabalho deveria partir sempre “dos valores jornalísticos de narração: variedade de fontes, histórias que sejam contadas de forma interessante, que todas as perspectivas sejam consideradas possíveis e que os temas antecipem informações relevantes; que mostrem novos tratamentos, tecnologias, formas de detecção precoce”. De igual forma, resultam serem muito valiosos os programas de denuncia que desenvolvem casos específicos, contextualizados e contrastados, que mostram histórias paralelas. Em alguns deles, ademais, se indagam assuntos que causam desconforto, que iluminam algumas práticas questionáveis. Isso gera a investigação e a pesquisa, um grande valor jornalístico.

Felipe Valenzuela salienta que um programa não consiste unicamente em reunir vários especialistas, microfones abertos e responder às perguntas dos ouvintes. Às vezes, é necessário estruturar um script que impacte, “procurar pessoas de diferentes formações acadêmicas, religião, classe social. E se encontrarmos vozes que possam ser gravadas e textualizadas se obtém um trabalho com uma grande riqueza, como por exemplo, o relato de pessoas que sofrem com a doença que está sendo investigada”. Cecilia Vaisman acha que os trabalhos poderiam aproveitar muito mais as ferramentas específicas para a rádio.
Em geral, os jurados destacam aqueles que estão preocupados com a transmissão de uma mensagem não só no que se refere a conteúdo, mas também aqueles que procuram inovar.

O PRINCÍPIO DA COMUNICAÇÃO É O COMPROMISSO COM A AUDIÊNCIA

O jornalista deveria relevar que o trabalho adquire sentido sempre e quando estiver em função do público: “mais além de uma boa informação, veracidade e justificativa, o jornalista tem que saber se é de interesse para o ouvinte. Se você não pode chamar sua atenção, não importa quão bom seja o seu trabalho”, diz Bernardo Esteves. Nesse sentido, deve-se sempre procurar um equilíbrio entre o impacto que pode ser gerado no público, a estrutura da narrativa, a qualidade do conteúdo e, é claro, a técnica. “Ai está à magia”, acrescenta. Se tudo isso for conjugado, então são criadas peças com “densidade emocional”, ou seja, “aquelas que com pouquíssimos minutos, provocam sensações que dizem muito”.

Felipe Valenzuela concorda que “às vezes um minuto na rádio representa horas e horas de trabalho, e cria um profundo impacto no ouvinte. Hoje vivemos em um mundo onde tudo acontece muito rápido, por isso, devemos fazer uma síntese eficaz do tempo”. Salienta que o jornalista deve ter muito cuidado na gravação dos áudios. É inaceitável, destaca ele, que se há todo um trabalho de pesquisas e investigação, os relatos das fontes resultem sendo incompreensíveis devido a problemas técnicos. “Por mais que seja um excelente relato, se não se entende, não serve”, diz Cecilia Vaisman. Num geral, os trabalhos requerem um equilíbrio entre a consideração do público, o rigor jornalístico e a qualidade narrativa, tanto na substância quanto na forma.

O ideal seria que além de tudo ele fosse propositivo, para quebrar os esquemas que foram engenhosos acrescenta o Dr. Rivera. E, é claro, “que se deve manter contato com o espectador, mais do que com os acadêmicos.” É muito mais eficaz capturar a atenção do ouvinte e, em seguida, introduzir gradualmente informações compreensíveis do que fazer pesquisas muito sofisticadas que ninguém vai entender. “Você pode fazer um grande trabalho que ninguém se interessa. E, embora ganhe muitos prêmios, talvez não obtenha impacto qualquer sobre a audiência”. Felipe Valenzuela lembra que o jornalista deve pensar sobre o que está falando para um público muito grande, na verdade, “todos os mundos que conformam os países. O que para nós pode ser muito elementar para outros pode ser uma descoberta”

NOVAS FORMAS NARRATIVAS: PLATAFORMAS, RECURSOS E ENGENHO JORNALÍSTICO

Bernardo Esteves faz um balanço dos temas mais recorrentes nos trabalhos inscritos ao Prêmio da categoria Internet. Entre eles, mencionou a violência obstétrica, o parto humanizado, o excesso de cesáreas, o HIV, a obesidade, os hospitais e a saúde pública. Em geral, os trabalhos partiram “do drama de um paciente para em seguida, discutir sobre formas mais amplas dos tratamentos, as doenças e até mesmo a política pública”. Houveram poucos, que mostraram uma abordagem diferente no sentido de que nem sempre a doença significa uma tragédia para a família.

Os jurados encontraram pouquíssimas histórias sobre medicina, saúde ou de investigação básica, e comentam a respeito da necessidade da especialização que requer o jornalismo em saúde para se aprofundar mais nos temas médicos e transcender a anedota.

Patricia Fernández de Lis observa que, na maioria dos casos, os trabalhos têm “uma abordagem social fabulosa” que parte da identificação de um problema social na comunidade, muitas vezes relacionados com problemas na saúde pública, para então, complementar com dados e diferentes fontes, entre elas as pessoais, as médica e as administrativas. No entanto, falta aprofundar nos temas concretos sobre ciência e saúde.

Para o Dr. Juan Rivera, grande parte dos trabalhos contam uma história. “Ao terminar de lê-los, senti que era apenas isso, uma história”. Ele diz que foi difícil encontrar contribuições médicas, pois muitos deles estavam focados em questões de saúde pública. Apesar de que “alguns incluíram elementos excelentes desde o ponto de vista científico, para os leitores com certeza tratam-se de dados incompreensíveis”.

Quando o Dr. Rivera faz jornalismo médico, ele acha que sempre se deve traduzir a mensagem de uma forma com que até mesmo alunos da oitava série possam entender. Para transmitir uma mensagem de forma eficaz, ele diz que, “você tem que baixar o nível da comunicação”. Em sua opinião, há duas maneiras de fazer isso. Por um lado, você pode apresentar um tópico de maneira tradicional, mas complementado por diagramas e num geral usando recursos audiovisuais que contribuem para a explicação, os dados que já existem e estão disponíveis para os leitores na internet. A outra maneira, é tratar de um tema que é desconhecido pelas pessoas, então deve ser realizado um trabalho centrado nos conceitos básicos e sempre apoiar-se aos diversos elementos da multimídia, tais como os que hoje são proporcionados pelas novas tecnologias. Para o Dr. Rivera, os trabalhos de pesquisa e investigação são os que mais contribuem porque ajudam a mostrar aos leitores o que está acontecendo e o que representam certas doenças ou avanços para futuro da comunidade global.

Bernardo Esteves, por sua vez, acrescenta que os trabalhos sobressalentes foram aqueles onde foram encontrados “um conceito, uma boa história, diagramas, fotos, mapas, vídeos, gráficos, ou seja, uma série de elementos que trabalharam a serviço da história e ajudaram a contá-la, a aluminá-la”. Não se trata somente de pesquisar um tema com rigor, mas também de descobrir como você pode aproveitar todo o potencial e os recursos oferecidos “as novas narrativas web”, como diz Patricia Fernández de Lis. Menciona, ainda, que houveram excelentes trabalhos de pesquisa, mas que não propunham uma narrativa inovadora para internet. É preciso “ver que há um esforço para conectar os recursos”. Não há que esquecer-se também do valor que fornecem as imagens. Muitas vezes, inclusive, resultam ser mais interessantes do que o próprio texto.

Os jurados concordam de que as linguagens hipertextuais foram pouco aproveitadas. Uma categoria de um prêmio de jornalismo on-line, premia a criação de conteúdos especificamente para diferentes plataformas (computadores, tablets e celulares); a inclusão de recursos multimídia, como vídeo, fotografia, links; integração com os usuários através de chats, redes sociais, etc. “É um caminho que falta ser percorrido, pois muitos dos trabalhos são um despejo do que foi escrito no papel em um site”, defende Patricia Fernández de Lis.

Coincidentemente, Liliana Sanchez acrescenta que alguns dos trabalhos incluíram recursos multimídia, mas que não os souberam integrar com a narrativa. Não se trata somente de apresentar “histórias muito bem escritas, com uma variedade de fontes e evidências sólidas. Falta um próximo passo e, é que se faça uma narrativa para plataformas online e celulares”. Na verdade, muitos trabalhos não podiam ser vistos no tablet ou em um celular, e deve-se prestar muita atenção neste ponto. “Não podemos reduzir a Internet para um texto, quando na maioria dos lugares um 50% dos acessos é feita através de celulares”. Devem ser gerados conteúdos especificamente para essas plataformas. “Não se trata de colocar um vídeo ou uma foto numa história. É contar uma história de maneira diferente. As narrativas devem ir juntas; isso é a multimídia”. Além disso, é vital para essas plataformas que o jornalista integre leitores-usuários através de redes sociais e que seja falado nessa mesma linguagem. Os hashtag, por exemplo, “nos permitem acompanhar as informações e nos abrem novas possibilidades narrativas”, destaca Fernández.

OS DESAFIOS PARA O JORNALISMO EM SAÚDE

O Dr. Rivera diz que “são necessárias histórias que comovam ao leitor, que o façam se sentir exposto, que o faça mudar a mentalidade de que ‘isso nunca vai acontecer comigo’. Mas também é importante dar veracidade a doença da qual se está falando”. Acrescenta que o jornalista deve aprender a sintetizar e a priorizar-se nos conteúdos. Às vezes, algo breve, diz muito mais do que a soma de vários conteúdos, embora estes também ajudem a contar uma história. Mas é preciso saber integrá-los.

Finalmente, Liliana Sánchez destaca o valor da co-autoria. Ela diz que em alguns casos encontrou trabalhos nos quais as imagens e os recursos multimídia continham muita informação, no entanto, na inscrição, somente aparecia o nome de quem havia escrito o texto. Devemos entender que “o novo jornalismo reconhece que, para fazer boas histórias se requer de uma força coletiva, de uma equipe que está comprometida com a pesquisa, com a investigação, desde a pessoa que segura a câmera até o que realiza a infografia”, concluiu ela…

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